Critical Watcher
O texto de hoje é de autoria de uma pessoa muito especial pra mim. É uma das meninas mais inteligentes e sensíveis que conheço. Seu nome? Ziliane Marques... Aqui vai um texto dela. Obrigado Zi, por compartilhar de tanto talento conosco. Beijos...

“A menina que toda boneca queria ter” – pensou a bebezinha gorducha. E era mesmo verdade: as bonecas enfileiravam-se para serem cuidadas pela sua tão estimada dona; e era uma estima real, visto que, até então, a menina era filha única e morava numa rua de poucas crianças. As bonecas eram mais do que companhia – eram companheiras de boas risadas, de choros contidos, de diálogos infindos sobre os mais variados e fantasiosos assuntos que uma criança pode conseguir desenvolver.

Desde novinha a garotinha se mostrava especial, a começar pelo nome pouco comum e que, muitos anos à frente, uma fiscal de sala observou sabiamente que era um nome digno de grandes pessoas. Aprendera a ler e a escrever aos três anos de idade, mas antes disso já falava pelos cotovelos (era a menina dos ‘porquês’); e até gostava de conversar com gente grande, uma vez que seu corpo diminuto abrigava uma alma infinda, adquirida ainda no ventre da mãe; gostava também de cantarolar junto com o pai as suas canções preferidas dos beatles, num inglês ainda primitivo, durante as viagens de família.

Havia um verdadeiro ritual de cuida: que ia desde lições no quadro-negro até uma canção de ninar ou um conto de fadas, dependendo do gosto das bonequinhas (a menina respeitava a individualidade de cada uma). Quando todas já estavam dormindo, o silêncio permitia que a garotinha se dedicasse à sua lição de casa e até mesmo lê-se os livros da estante dos pais, enquanto sua mãezinha dormia. E foi assim que ela descobriu precocemente Drummond, poesia, auto-ajuda, psicanálise, religião, arquitetura medieval, a teoria introdutória do direito, mas também descobriu Hitler (numa biografia já amarelada que ela releu nas últimas férias e achou genial, embora aterrorizante), as guerras, o nazismo e tantos outros temas que a minha mente ocupada por reações químicas, descrições de processos metabólicos e conceitos físicos já não me deixa recordar.

E as bonecas iam sendo abandonadas, sem entender o porquê de serem trocadas por pedaços de papéis cheios de palavrinhas complicadas. Elas ainda tentaram, em vão, esconder os tais papéis, mas a menina era esperta e descobria o esconderijo de um por um dos livros. Até os duendes ficaram enciumados, já que a menina não mais conversava com eles, nem pelo pote de ouro ela perguntava, nem mais acenava do carro quando via os cogumelos-gigantes-de-chapéu-vermelho-e-bolinhas-brancas.

As bonecas ficaram cada vez mais esquecidas em baús embolorados. E aquele mundo de magia que permeava o quarto da menina esvaiu-se. Mas em certas manhãs chuvosas, elas merecem ser recordadas, com aquelas recordações de amizade sincera que o tempo não pode apagar, com um saudosismo redundantemente nostálgico daqueles tempos em que a magia era menos vinculada às páginas dos livros e às cenas dos filmes, em tempos que as pessoas pareciam boas e sinceras, e que a maldade ficava restrita aos livros de guerra; embora uma pitada de sarcasmo pudesse, na opinião da menina já crescida, tornar uma conversa mais interessante.

E a bebezinha gorducha nem percebia o baú fechar lentamente, seus olhos de amêndoas estavam fixos na sua menina já crescida; eram olhos de alegria por tê-la perto, por sentir seu abraço quentinho de mãe, e por perceber que ainda havia no coração dela aquele amor puro, ingênuo e despretensioso. E notou que, dentro em breve, a sua menina se tornaria uma mulher especial, embora ainda calçasse o mesmo modelo de all star de tantos anos atrás; e pensou, tendo um leve calafrio, que se fosse criada com aquele sarcasmo atual, teria se tornado igualzinha ao chuck – entendendo que as bonecas realmente estão presentes nos momentos certos. Fechou os olhos e dormiu profundamente, esperando que sua menina crescida fosse mãe, para dar a sua alegria para outra criança.

Ziliane Marques, 20/03/2008, memórias antigas numa manhã chuvosa, escrevendo ao invés de estudar biologia.

Critical Watcher
"Foto encontrada no gettyimages.com"

Pai, eu estava aqui pensando. Era tão bonito vê-lo chegando do trabalho, trazendo novidades de seus dias corridos e cheios de estresse. Era tão bom perceber a felicidade que você sentia por mais um dia cumprido. Eu costumava comparar, mesmo que só pra mim, que você era um leão. O rei de todos, capaz de lidar com primor nas situações mais necessitadas de um líder. E você também cantava aos céus. Jogava ao alto seu coração e deixava que o Pai cuidasse. Dizia que só Ele é quem pode nos dar a salvação eterna. Sua fé era muito maior que a minha, muito maior que a de meus irmãos. Sua fé chegava a impressionar os que conviviam com seu sofrimento. E era motivo de meu orgulho. Acabei me tornando uma pessoa mais fervorosa. Eu louvava, chorava enquanto ouvia a Palavra, estendia minhas mãos aos outros... Eu sentia a presença Dele ao meu lado. E isso me dava mais confiança, pois tudo que eu mais queria eu sempre estava a pedir. Eu queria você por mais um pouco de tempo. Eu queria que você regozijasse de sonhos como possuir netos, ver seus filhos passando no vestibular, morar numa fazenda, festejar o meu sucesso profissional. Ah, pai. Você hoje me faz uma falta imensurável. Na verdade, sempre fez. Mas hoje é ainda maior. Eu o tinha todo dia. Você estava aqui... E existem cenas que nunca sairão de minha mente. Lembro-me da vez que, sem forças, você encostou sua cabeça sobre meu peito. Aquilo me cortou o coração. Você nunca foi tão sensível a esse ponto, mas nesse dia foi diferente... Você deixou que eu sentisse o medo que você guardava em si. Você queria viver mais. Mas a possibilidade de morrer já era muito alta. E para que nós não sofrêssemos, você se afastava de sua família e de todos. Acho que sua intenção era que acabássemos nos distanciando de um problema que estava prestes a trazer muita dor. Poucos dias depois, você se vai. Eu, ao seu lado. Estava a sentir cada respiração ofegante que ainda você lutava pra vencer. Estava com você na vista de meus olhos. Até o último suspiro.

.

- Eu me sinto tão volúvel quando penso em você. Tão volúvel. Volúvel eu fico quando penso em você. E eu grito aleluia pro alto. Consegue me ouvir, pai?

[Silêncio.]

Critical Watcher

Estava mais angustiado que um goleiro na hora do gol.

Nem consigo mais escrever pelo email.

Nem sei o que dizer diante de sua inteligência.

Sabe, vou te contar um segredo.

Eu te acho o máximo!

Quero vazar no seu céu; pode ser no seu inferno.

Entender que tudo tem seu tempo é minha meta.

Esperar por suas promessas que se fazem nossas.

Sorrir o sorriso daqueles filmes de romance.

Meu amor é uma coisa mais profunda que um acaso pessoal.

E as músicas que recebo me fazem refletir.

Ouço cada palavra com uma delicadeza que me surpreende.

Cada verso é motivo de lágrimas.

Purificação da alma.

Porque o amor é uma coisa mais profunda do que uma transa sensual.

Ando falando em tantos amores.

Criando tantos momentos.

Chorando noites sozinho.

Relembrando nossas gargalhadas ao vento. (Lembra-se?)

Quero gozar no seu céu, pode ser no seu inferno.

Quero te fazer perder medos.

Quero esquecer dos meus.

Quero encontrar um modo de dizer que só você.

Só você.

E ninguém mais com meu amor.

Divina Comédia.
Critical Watcher
Foto: Marc Romanelli
Parados estavam eles naquele banquinho da praça a admirar a velocidade com que aquelas pessoas caminhavam ali; não olhavam sequer ao lado, criando um submundo voltado pra sua própria realidade.

Entreolharam-se por um milésimo de segundo, mas preferiram manter o silêncio. Pareciam estar presos em sua própria realidade, já não havia mais ruído, já não havia mais pessoas. Só restavam pensamentos.

E mesmo diante daquele grau de contato íntimo com o seu próprio eu, cada um deles fazia dos olhares que sobrevinham uma forma de encontrar o caminho do outro. E a taciturnidade ainda reinava naqueles gestos tão delicados.

Qual será o melhor caminho a seguir? Perguntavam-se.
As dúvidas pareciam gritar em suas cabeças e ao mesmo tempo, o coração palpitava cada vez mais rápido, cada vez mais confuso.


A verdade é que eles dois tinham muitos pensamentos em comum, mas de que adiantava? O medo sempre se tornava vilão da situação e apoderava-se de qualquer tentativa de fuga ou subterfúgio. No entanto, a força dos dois veio à tona. Encararam suas dúvidas e receios com o coração valente e aberto.

Não havia mais tempo para procrastinar. Era tarde e o tempo parecia passar cada vez mais rápido. Em medidas assustadoras, eles viram suas vidas passarem em um segundo. Será que tinha valido a pena? Era hora de seguir em frente.

Ele deu sua mão pra ela, fazendo-a segurar fortemente. Ela, sorrindo, apertou ainda com mais força. Não falaram nada e, olhando para o horizonte, começaram a correr sem descanso. Nada fazia mais sentido parar ali. Incansavelmente, por dias e noites, estavam os dois contornando a mecânica falha de seus corpos.

E entre tantas pessoas que antes ali estavam, entre tantos bancos, tantas praças, eles se encontraram. Estranhos e unidos, somente pela vida.
----------------------------------------------------
Ps.: E em meio a uma conversa de msn... A imaginação rola solta. Esse post tem participação especial de Monick Vasconcelos. Obrigado, menina linda! Acho que nossos pensamentos colaram. Beijos!
Critical Watcher
[Assim era ela: estatura mediana, cabelos pretos e compridos, olhos estarrecidos, boca débil, corpo quase que escultural... Usava sempre vestidos longos e esguios, denunciando sem intenção alguma as suas formas arredondadas e atraentes.]

Caminhando por aquela rua negrume, ela não cessava de chorar e de abraçar o seu próprio corpo. Por vezes, sem forças alguma pra continuar, parava em algum canto daquela vila e sentava-se. Sua tristeza era tão profunda e inquieta que até mesmo os mendigos e ladrões se comoviam diante dela. E toda noite, a lastimosa moça fazia o mesmo percurso, chorava o mesmo pranto, padecia do mesmo problema. Ela não tinha vergonha alguma em denotar seu sofrimento, ela não vigiava dentro de si o assombro que lhe passava em mente. Talvez fosse isso que a mantivesse de pé; talvez fosse a ausência do confinamento que lhe presenteasse com alguns dias a mais de vida.

Tudo era muito baseado no talvez, afinal ninguém sabia ao certo o que deveras ofendia tão amargamente aquela moça. Cada dia que se passava, a mágoa acirrava, a melancolia envaidecia, a aflição apossava. Chegava a suspirar uma dor física, expurgando em lágrimas o possível veneno que a corrompia. E ouviam-se gritos cada vez maiores, torturas cada vez mais mórbidas.

Corriam boatos na cidade sobre a personagem principal das noites escuras e silenciosas, que sempre quebrava o sossego que ali reinava. Dizia-se que, talvez, ela sofresse de alguma surdez ou algo parecido. Nunca ouvia as perguntas curiosas que os outros lhes lançavam. Nunca sequer deixou alguém tomar conhecimento da razão de seu infortúnio. E quanto mais pessoas apareciam, mais padecimento esvaía. As dúvidas não passavam de indiscrição dos outros, desfavorecendo sua expectativa de socorro ou lenimento.

E algo mudara completamente o quadro daquela situação. Agora o vento frio das madrugadas agravava o terror. O circo que se montava diariamente pra esperar pela causa dos risos insaciáveis transformava a dor em fúria. A agonia já não possuía o mesmo talento, pois o ódio lhe tomara o espaço. As lágrimas estancaram e deram lugar a olhos ressequidos e cheios de peçonha. A curiosidade foi arbitrariamente seguindo seu caminho em outra vereda, mas deixou marcas profundas na vida daquela menina que, antes, só sabia chorar.

[– Ninguém nunca me deu amparo. Nunca existiram abraços ou sorrisos que não fossem os de reprovação. A minha saída estava em meu pranto, nas poesias elegíacas que dele surgiam. E, hoje, tudo fica em mim. Toda a amargura que antes eu conseguia arremessar ao mundo, em mim fica guardada, depositada em formas desguarnecidas, em sentimentos que carregarei pro resto da vida.]

E ali mesmo deu seu último suspiro. O adeus que precisava pra poder, ao menos, lamentar em paz.

--------------------------------------------------------

Olá, pessoal. Antes de tudo, venho desculpar-me do afastamento que venho mantendo de meu blog. A questão é que meu tempo está cada vez mais escasso e é uma pena não poder estar desfrutando das pérolas que todos vocês criam. Gostaria, também, de mandar um forte abraço pra Jaya e pro Sr. Ziggy, que me presentearam com dois novos selos. Obrigado a vocês dois. É muito bom saber que tenho pessoas a me ajudar constantemente.







Aqui vão meus merecidos indicados:

Sede Devaneios, da Gi.

Fragmentos de Jô, da Jô.

Quintal de Cores, da Jú Caribé.

Ma Passion Rouge, da Gabriela.

Segundas Intenções, d[A] Bem Intencionada.

Parabéns. Beijos... ;)